
Amados irmãos e irmãs em Cristo,
Hoje celebramos um acontecimento discreto nas Escrituras, mas grandioso na Tradição da Igreja: a Entrada da Mãe de Deus no Templo — o início visível de uma obra invisível, pela qual toda a humanidade receberia o Deus encarnado. Este dia santo não é apenas memória, mas é uma imagem viva do caminho interior ao qual cada um de nós é chamado.
Os Santos Padres veem este dia como a primeira luz do cumprimento da promessa. A pequena Maria entra no Templo não apenas para levar uma vida retirada, mas para tornar-se Templo vivo do Deus Vivo. São Gregório Palamás (sec. XIV) afirma que a Virgem foi “o primeiro templo verdadeiramente santificado”, pois nela não houve apenas ritos e símbolos, mas habitou a própria Essência.
E isso se prolonga na nossa vida: não somos chamados apenas a frequentar o templo, mas a ser templo. Sempre que entregamos a Deus a mente, o coração, a vontade, preparamo-nos — como a Virgem — na simplicidade, na obediência e na pureza, para que Cristo nasça em nós. Maria é conduzida ao templo pela simplicidade da infância. Ela não pergunta “por quê?”, não calcula, não duvida. Entra no lugar santo com a confiança total com que uma criança estende a mão ao pai.
Os Santos Padres chamam esta atitude de inocência da mente — estado essencial ao começo da vida espiritual. Na nossa vida interior, significa: abandonar a “sabedoria mundana” que quer controlar tudo, apresentar-nos diante de Deus com coração simples e dizer: “Senhor, eis-me aqui. Ensina-me Tu”.
A Entrada no Templo é a entrada no coração, que é templo do Espírito Santo. Não existe obra espiritual maior do que este retorno para dentro, onde Deus deseja falar connosco.
A tradição hesicasta vê a vida de Maria no Templo como modelo da vida espiritual:
a) Purificação: A Virgem passa anos em jejum, oração, silêncio e obediência. Não é apenas vida monástica; é imagem da nossa luta para limpar a mente de pensamentos confusos, desejos desordenados e da própria vontade.
b) Iluminação: Maria alimenta-se das Escrituras, da oração, da graça. Os anjos a instruem. Em nós, a iluminação chega quando fazemos descer a mente ao coração, quando nos deixamos formar pela Palavra de Deus e buscamos recolhimento no meio do ruído do mundo.
c) Divinização: A entrada dela no Santo dos Santos prefigura a visão de Deus — união da vontade humana com a divina. Ali, Maria torna-se “raiz da Encarnação”.
Na nossa vida, essa união se manifesta na paz profunda, na obediência sem resistência, no amor capaz de perdoar tudo. No Templo, Maria permanece em silêncio santo, escutando. Este silêncio não é vazio, mas espaço criado dentro da alma para que Deus possa falar.
Não ouvimos Deus porque Ele não fale, mas porque há demasiado ruído dentro de nós. A festa de hoje convida-nos a recuperar: o silêncio dos pensamentos, o silêncio dos julgamentos e o silêncio atento do coração. São Isaac, o Sírio, afirma: “O silêncio é o mistério do século futuro.”
Foi nesse silêncio que Maria recebeu a grande revelação: que ela mesma seria o Santuário do Incontável.
A nossa pergunta de hoje é como entrar no templo do coração?
- Pela pureza da mente: Rejeitar pensamentos que dividem, obscurecem e entristecem. Cada pensamento guardado é uma semente: que seja semente de luz.
- Pela disciplina espiritual: Criar hábitos santos: um tempo fixo de oração, uma leitura bíblica diária, um momento de recolhimento. Não importa a quantidade, mas a fidelidade.
- Pela renúncia da própria vontade: Toda a vida de Maria diz: “Faça-se a Tua vontade”. Podemos repetir cada dia esta oração, mesmo quando ainda não sentimos plenamente seu sentido.
- Pela entrada no templo da Igreja: Assim como a Virgem entrou no Templo, cada Liturgia é a nossa entrada no Santo dos Santos, na presença de Deus. Ali alimentamo-nos do Corpo e Sangue de Cristo e tornamo-nos templos vivos.
Neste sentido, a Mãe de Deus — espelho do nosso coração. Maria, entrando no Templo, não traz nada grandioso aos olhos do mundo. Ela não chega como alguém importante, mas como uma criança.
Na vida espiritual, infância é maturidade; humildade é liberdade. Ela nos mostra que a maior realização não está nas grandes obras, mas na simplicidade com que permitimos que Deus habite em nós.
Se hoje decidirmos transformar o coração num templo: afastando a ira, silenciando os julgamentos, limpando o interior de ressentimentos e acendendo a lâmpada da oração, Cristo descerá nele com a mesma alegria com que entrou no seio da Virgem Maria.
A Entrada da Mãe de Deus no Templo é o início do encontro definitivo entre Deus e a humanidade. Nela, o fio humano se entrelaça com o divino. Por isso, os Padres dizem que hoje também se santificam os nossos começos: qualquer pequeno passo interior, qualquer oração fraca, qualquer lágrima de arrependimento — tudo se transforma em entrada no templo da graça.
Caríssimos irmãos, em cada um de nós existe um Santo dos Santos — um lugar profundo onde Deus espera ser acolhido. A Mãe de Deus ensina que não celebramos apenas o passado, mas o que podemos nos tornar: templo da paz, câmara da luz, casa da alegria e morada onde Deus repousa.
Peçamos à Virgem que nos tome pela mão, como o sacerdote Zacarias a tomou outrora, e nos conduza para dentro do templo do nosso coração.
“Santíssima Mãe de Deus, abre também para nós as portas da misericórdia, para que, entrando no templo do coração, Cristo — a Luz do mundo — possa nascer em nós.” Amém.
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A estequéra nas Vésperas: Hoje, ajuntando-se em coros os fiéis, celebremos espiritualmente a festa, e com piedade exaltemos a Filha de Deus, a Virgem e Deípara, que é apresentada no Templo do Senhor; Ela, a escolhida entre todas as gerações, como morada do Cristo Pantocrator, o Deus de todas as coisas. Ó virgens, ide à frente com lâmpadas acesas, honrando o venerável ingresso da Sempre-Virgem; e vós, mães, deixando toda a tristeza, segui jubilosas, louvando-A, que Se tornou Mãe de Deus e causa da alegria de todo o mundo. Todos, pois, com alma jubilosa, exclamemos com o Anjo o “Alegra-Te!” À Cheia-de-Graça, que sempre intercede por nossas almas.
Apolitíkion – 4º tom: É hoje o prelúdio da benevolência de Deus e a proclamação antecipada da salvação dos homens. No Templo de Deus apresenta-se com esplendor a Virgem e a todos prenuncia a Cristo. A ela clamemos também nós, em alta voz: “Salve, ó implemento da economia do Criador!”.
Kontákion: O mais puro templo do Salvador, alcova virgem do mais alto preço, sacro tesouro da glória de Deus, é hoje introduzido na casa do Senhor, aí co-introduzindo a graça, a do Espírito divino. Cantam-lhe hinos os anjos de Deus: “ela é verdadeiramente um tabernáculo celeste!”.
Megalinário: Vendo os anjos a entrada da Puríssima quedaram estupefactos, vendo como a Virgem penetrou até ao Santo dos Santos.